Blog Rocha 100

No princípio, criou Deus os céus e a Terra”. Ótima frase para um Blog que navegará 100 fronteiras: dos céus metafísicos à “rude matéria” terrestre. “Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou”. Pois, somos também deuses, e criadores. Podemos, principalmente, criar a nossa própria vida, com autonomia: isto se chama Liberdade. Vida e Liberdade são de Deus. Mas, quem é “Deus”? Devotos hebreus muito antigos, referiam-se a Ele apenas por perífrases de perífrases. Para Anselmo de Bec, Ele é “O Ser do qual não se pode pensar nada maior”. Rudolf Otto, diante da dificuldade de conceituá-Lo, o fez precisamente por essa dificuldade; chamou-O “das Ganz Andere” (o Totalmente Outro). Há um sem número de conceitos de Deus. Porém, o que mais soube ao meu coração foi este: “O bem que sentimos intimamente, que intuímos e que nos faz sofrer toda vez que nos afastamos dele”. É de uma jovem filósofa: Catarina Rochamonte.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Cracolândia: a internação involuntária e a demência voluntária

O programa de internação involuntária de drogados iniciado segunda-feira (21/01) pelo Governo de São Paulo pode ter resultados ótimos ou pífios. Mas, tal como apresentado, está bem planejado. O foco são os viciados da cracolândia, aqueles em estado grave. A possível internação virá cercada dos mais rigorosos cuidados e garantias: equipe de profissionais de saúde, acompanhamento do Poder Judiciário, consentimento da família e autorização de um juiz.

A medida é drástica, mas não podia ser de outra forma. Trata-se de tirar pessoas do inferno em vida. Trata-se de arrancar pessoas da morte iminente e escancarada.

Quem já teve contato direto com um viciado em crack em estado avançado sabe que é assim. Quem não teve, mas conversa com quem já teve ou simplesmente acompanha o noticiário, pode fazer uma idéia.

Todavia, pessoas muito bem informadas se posicionaram contra a internação involuntária e criticam a iniciativa do governador Geraldo Alckmin. Entre essas pessoas está o prefeito de São Paulo, o petista Fernando Haddad. Este, no entanto, diga-se,  tem usado um tom moderado. A crítica radical, acerba e feroz tem ficado por conta de entidades e movimentos sociais que foram às ruas com cartazes e discursos ácidos.

"Usuário não se prende", traz um cartaz; "A internação compulsória depõe contra a dignidade humana e a liberdade cristã", apela outro. Quanto aos discursos, sobressaíram-se dois padres. Um deles, o Padre Júlio Lancelloti, da conhecida pastoral Povo da Rua, disse: "Essa é uma medida drástica e bombástica, que quer facilitar algo que é ineficaz".

Já o Padre Raniel, da menos conhecida A Fraternidade é o Caminho, considerou, segundo reportagem da Folha de São Paulo, que a medida é opressora e atenta contra a dignidade do dependente químico e o seu livre arbítrio. Para ele, registra a reportagem, é preciso dar poder de escolha ao dependente químico.

Não seria de se esperar tolices tão nocivas da parte de dois homens de Deus. Nem por ser drástica e bombástica a medida será necessariamente ruim. E essa medida é drástica e bombástica porque a questão é drástica e bombástica. A fome, por outro exemplo, é drástica e bombástica. O ex-presidente Lula, no seu primeiro governo, anunciou a medida drástica e bombástica de erradicação da fome, através do programa Fome Zero. Drástica e bombástica também foi a medida de erradicação da miséria anunciada pela Presidente Dilma, logo no início do seu mandato.

Quanto ao Padre Raniel, que os católicos rezem por ele, um caso grave de falta de discernimento. A medida drástica da internação involuntária se impõe, exatamente, como tentativa de salvar a dignidade e a vida do viciado, que estão, vida e dignidade, nas garras da droga (e nas mãos dos traficantes). O que a drástica medida visa é, precisamente, fazer o viciado voltar à consciência/livre arbítrio ao escapar da sujeição demencial da droga. Quanto a dar poder de escolha a um dependente de crack em estado avançado, significa reafirmar o poder da droga: a droga é já, imperiosamente, sua escolha e opção. O que a drástica medida tem por objetivo é, justamente, fazer com que o viciado, livre do vício, volte a ter poder de escolha.

A reportagem da folha registra também literalmente parte da fala do Padre Raniel, assim:

"A Igreja quer respeitar a dignidade do ser humano. Que ele tenha o poder de escolha, que ele possa se recuperar da dependência química".

Pois muito certa está a Igreja.

Padre Raniel, pelo amor de Deus, reflita: o sentido da medida drástica da internação involuntária é justamente o de dar essa chance ao viciado.

Mas terá sido do vice-presidente do CRESS-SP, Marcos Valdir Silva, a fala mais sem sentido. Vejam:

"O dependente de drogas precisa de tratamento e não ser privado de liberdade e ser submetido a um tratamento".

Deus do Céu! É somente porque o dependente de drogas precisa de tratamento que, estando na máxima impotência e às portas da morte, é preciso que, excepcionalmente, se imponha a restrição de liberdade para que se possa fazer tal tratamento.

A internação involuntária, nos casos-limite, chega a ser um imperativo de humanidade. Já a campanha contra esta internação humanitária é um caso de demência voluntária.    

Um comentário:

  1. Beleza, Washington. Este país está uma graça. Daqui a pouco o pessoal dos Direitos Humanos vai denunciar pais, médicos e enfermeiros que aplicarem qualquer injeção nas crianças, porque não há um menino sequer que não rejeite as agulhas aos berros. E obrigar a ir à escola? Isso contraria frontalmente o direito de ir e vir, que inclui o de não ir.

    W. J. Solha

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